Felicidade


Tenho visto pouca gente feliz. Vejo mais pessoas circunstancialmente excitadas e entusiasmadas do que aquelas que gozam da felicidade genuína. Vejo muitos que confundem ser feliz com parecer feliz. A verdadeira felicidade é serena, tranquila, pacífica e transmite justamente isso. A verdadeira felicidade é uma celebração à vida tal e qual ela é: sagrada, indescritivelmente bela e cheia de propósito. Quem está inteiramente presente e Vê a vida sente Deus e o Amor que dele emana. Para estes, a felicidade é inevitável.

Por que há poucas pessoas felizes se a grande maioria quer ser feliz? Pelo menos é isso o que dizem e chegam, inclusive, a apontar a felicidade como o objetivo maior da vida. Como pode ser que tantos vivem uma vida de muito esforço e trabalho, correndo para conquistar o que dizem ser seus desejos e, ainda assim, serem infelizes? Há algo errado aqui.

Onde está a felicidade? Onde se esconde esse que parece ser um dos maiores desejos humanos?

Antes de mais nada, ao contrário do que muitos podem pensar, não nascemos com o propósito maior de sermos felizes. E nem esse mundo é um parque de diversões, feito para nos manter contentes e entretidos, ou um paraíso, feito para aqueles que o merecem. Estamos vivos para aprender algumas lições e crescermos com isso. A felicidade é desejável e sua verdadeira expressão está intimamente relacionada ao cumprimento de nossa tarefa de aprender e crescer, mas poucos entendem isso.

Ficamos felizes como consequência de encontrarmos a quem realmente somos e, a partir disso, sabermos o que devemos fazer e nos entregarmos a essa missão. Sem isso não há como sermos realmente felizes. O problema é que se busca fora o que está dentro. O normal é se investir quase todo o tempo com os compromissos, com os prazeres, com as posses, com uma avalanche de informações supostamente necessárias e com uma infinidade de coisas que existem no mundo que criamos para nos manter eternamente ocupados e, não por acaso, distantes de nós mesmos. Uma pessoa que não sabe quem é e para que veio ao mundo acaba assumindo papéis estranhos a si mesma, se perde e se ocupa cada vez mais para esquecer do quão vazia, sem propósito e infeliz está sua vida.

Então, para sermos felizes, em primeiro lugar é necessário nos alinharmos ao que somos, tanto como seres humanos quanto como indivíduos. Para isso, precisamos ter periodicamente um tempo só nosso, o tempo do silêncio e da meditação para se olhar para dentro. Depois sim, podemos fazer o resto. Mas, quem medita? É uma pena, mas sem isso, sem chance. Sem isso, a infelicidade provocada pelo desalinhamento é garantida.

O primeiro passo para nos conhecermos é entendermos que fazemos parte de uma humanidade e que, assim, devemos aderir aos seus desígnios. Isso significa que existem tarefas a serem cumpridas por todas as pessoas. A missão básica da humanidade dos últimos milênios é aprender a amar a Deus (e a natureza, que é parte dele) e a si mesma (com todos amando a si mesmos e ao próximo, como já foi dito há 2000 anos pelo Mestre Jesus). E quem ama, é claro, respeita e reverencia. Para isso, precisamos primeiro aprender a amar, pois muitos ainda nem sabem o que é isso realmente. Chamam, erroneamente, a muitas coisas de amor. Desejo, prazer, posse, domínio, poder, dependência, interesse e uma infinidade de desalinhamentos emocionais costumam ser chamados de amor. Também cabe a atual humanidade dominar as emoções, saber usar a mente racional (e não ser usada por ela) e conhecer e seguir o fluxo divino evolutivo do universo (como se houvesse alguma outra opção). O conhecimento do fluxo universal implica em sabermos do que são feitas as coisas, quais os seres que existem conosco e qual é o momento atual da humanidade. Depois disso, outras tarefas virão para a futura humanidade formada por humanos mais evoluídos do que os atuais.

Estas tarefas básicas da humanidade não podem ser cumpridas por pessoas desconectadas de si mesmas e, consequentemente, da realidade maior do universo. Por exemplo, não há como se amar sem estar presente, pois, assim, sequer é possível se ver e sentir. Infelizmente, muitas pessoas estão extremamente desconectadas.

O passo seguinte (ou simultâneo), é que cada um deve encontrar a si mesmo, a sua essência maior de origem divina que sabe quem é e o que deve fazer nesta vida. Conhecer a si mesmo deveria ser simples e natural, mas como esta é uma sociedade de pessoas educadas a olhar apenas para fora e a viver das sensações e distrações externas, a esmagadora maioria acabou ficando estranha a si mesma. Uma consequência disso, além da infelicidade? Doenças auto-imunes. Para se conhecer o crucial é se ter o hábito periódico de vivenciar o silêncio, que nada mais é do que não sofrer nenhuma interferência externa e interna, esta sob a forma de pensamentos. Essa é uma forma de meditação. Sem meditar é muito difícil ver-se a si próprio e, sem isso, é improvável que alguém possa se conhecer e se dedicar a sua missão pessoal de vida. Isso deve ficar bem claro, especialmente àqueles que estão sempre super ocupados e correndo atrás de algo externo que nem sabem mais o que é.

Há mais coisas a se saber sobre o caminho da humanidade e pessoal, mas, para o público em geral que está apenas correndo sem rumo para lá e para cá e buscando fora o que está dentro, não há porque se aprofundar mais. Se não conseguem entender nem seguir o básico, é inútil ir adiante em mais conceitos e instruções. Cada um constrói seu caminho caminho de crescimento ou ruína.

Aos que procuram a felicidade apenas no normótico pensamento que indica os caminhos externos da busca do poder e das posses, da constante ocupação ou da diversão, recomendo que observem os que já obtiveram os “benefícios” desses caminhos há bastante tempo. Procurem neles a verdadeira felicidade, caso a conheçam. Se a dita normalidade está certa, então neste grupo de pessoas encontraremos a realização, a paz, a sabedoria e a felicidade. Observem os que já viajaram por todos os cantos do mundo, os que tiveram todo o sexo que desejaram, os que vivem em eternas férias ou trabalho, os que são muito abastados de bens materiais, os famosos, os que tomaram todas as drogas disponíveis, os que experimentaram todas as delícias, os que são poderosos dentro dos conceitos humanos, os que buscam benefícios pessoais através de trocas com o baixo mundo espiritual. Observe os mais belos. Os mais desejados. Os reis. Os “donos” do mundo. Observe também os que estão sempre conectados às redes sociais, às notícias, aos filmes, aos shows, à tudo. Quantos destes são verdadeiramente felizes? Se você estivesse morrendo num estado de grande solidão e pudesse dar a mão para alguém para poder sentir, nem que por um instante, ser importante para outro e não estar só (veja só, amor!), para qual dos ricos ou famosos você gostaria de dar sua mão antes do seu último suspiro?

Vejo muitos que correm. Muitos que fogem nos prazeres externos. Muitos que se escondem nos padrões do status social. Muitos que se escondem na família, na empresa, no trabalho, nas realizações alheias. Há muito tempo um amigo se referia a estes como os que gozam com o prazer alheio. Muitos que se acostumaram e até se apegaram a sua conhecida infelicidade cotidiana. Muitos que atribuem a culpa de tudo ao mundo injusto no qual vivem. Muitos desequilibrados. E alguns que se matam. Uma mera consequência de quem se perdeu de si mesmo.

E há muitos que se medicam com psicoativos. Descontando aqueles que realmente possuem problemas graves o suficiente para usarem estes medicamentos, sobra a grande maioria dos que apenas não querem se incomodar tanto com as dificuldades de um dia-a-dia distante de seus corações. Infelizmente estes medicamentos desconectam ainda mais o usuário de si mesmo e do universo do qual fazem parte diminuindo assim, se não impossibilitando, a chance da tão almejada felicidade. Reparei que estas pessoas, que não são poucas, tornam-se mais ausentes ainda. Mais apáticos e insensíveis, deixam de chorar, de rir verdadeiramente, de sentir tudo o que devem e podem. Aumentam ainda mais o padrão de não se estar presente por inteiro, possivelmente com aquela parte da mente e do coração ainda não bem adormecidos viajando noutro tempo, noutro lugar ou na pura imaginação. Aumentam o comportamento normótico de se seguir um script de comportamento padrão enquanto a alma, conexão com seu eu verdadeiro, não está presente.

Aos que fogem, lembrem que a dor é um aviso que chama à reação que cria a mudança. Se há um problema, há que se resolver e não se fugir eternamente, pois o problema não só não irá embora como aumentará. Se algo está errado, há que se descobrir o que é através do questionamento, da meditação, do amor dos familiares e amigos, de terapias ou de orações, por exemplo. Esta descoberta muitas vezes nem é racional e nem depende apenas do indivíduo. Descobrindo-se o que está errado, é necessário se ter coragem e agir para mudar. Nada é de graça e enganam-se os que pensam que a fuga é gratuita. De fato, é bem mais custoso esse caminho, pois o crescimento e a evolução através da verdade não é opcional, mas lei inabalável do universo.

Para terminar, nunca devemos esquecer de que nossos sentimentos e pensamentos são reais, criam manifestações no mundo físico e atraem sentimentos e pensamentos alheios semelhantes. Logo, também importa vigiar e comandar os próprios sentimentos e pensamentos para que eles tenham uma qualidade adequada à felicidade. Uma armadilha comum: fugir de um vazio interno (divertindo-se?) vendo novelas e filmes que mostram violência, vingança, injustiças e tantos sentimentos e pensamentos dessa qualidade. O incauto espectador vê, sente, vive, reproduz e, assim, torna-se também culpado pelo que atrai para si e pelo que passa aos outros.

Se todos soubessem como é simples e como está tudo dentro de cada um e imediatamente ao seu redor poderiam experimentar uma energia, um calor, um afeto e uma harmonia não compreensíveis aos que correm desconectados atrás de ilusões irreais e, por isso, inalcançáveis. Poderiam experimentar o amor assim como se pode sentir calor. Poderiam se unir e experimentar um estado contínuo de gozo com seus amores inexplicável aos fornicadores que não conhecem nada além de um orgasmo. Ou nem isso.

Apesar de o propósito maior da vida humana atual não ser nem a felicidade nem o prazer, estes acompanham a quem se dedica a ser o que deve. Quem ama a Deus acima de tudo, ao próximo como a si mesmo, não se apega às sensações deste mundo, apesar de viver intensamente nele e, assim, cumpre o que foi dito há milênios em vez de apenas participar de cultos, anestesiar-se, correr atrás do supérfluo inalcançável e permanecer sempre desconectado, crescerá, evoluirá, ajudará e, ainda, terá mais prazer do que os que se dedicam às sensações deste mundo. E será feliz, de verdade.

Lembremos sempre que muitos mestres, como Buda e Jesus, disseram para não nos apegarmos aos produtos dos sentidos terrenos e a buscarmos a verdade onde ela está. Disseram que o reino de Deus está, também, dentro de nós mesmos e que ele não é feito de templos de pedras.

Sobre Luciano Pillar

Brasileiro de Porto Alegre, RS. Segundo um leitor: "Capaz de despertar as pessoas através das letras, mesclando temáticas improváveis e fazendo-as chegar a conclusões maravilhosas". Veja mais aqui.
Esse post foi publicado em amor, comportamento, espiritualidade, evolução, felicidade, sentimento e marcado , , , , , . Guardar link permanente.

5 respostas para Felicidade

  1. Fernando disse:

    Tchê! …Pra variar, mais um texto FANTÁSTICO!

    Estou sem palavras… Bom… Talvez porque elas não sejam mesmo necessárias!

    Um “simples” OBRIGADO, então!

    Grande abraço, meu camarada!

  2. Eddie Van Hendrix disse:

    Dom Luciano,

    Felicidade… assunto espinhoso.
    Ainda mais, quando buscamos uma receita.
    Eu posso, no máximo, sugerir um ou dois ingredientes.
    Mas para a felicidade mais phodástica, que se confunde com estado de graça ou com beatitude serena, não existe receita.
    C. Drummond(?), se bem lembro, citou uma variante bem interessante, a felicidade autêntica: aquela em que se é feliz, mesmo sem ter motivos.

    Enfim, excelente texto.
    Parabéns!

    • Luciano Pillar disse:

      Dom Eddie,

      Ser feliz, mesmo sem se ter motivos aparentes, deve ser algo que acontece com aqueles que vivem e são quem realmente são, seguindo seu caminho verdadeiro, ou com os malucos que tem a sorte de chegarema à felicidade através de seu afastamento de sua realidade e da realidade comum aos outros.

      Agradeço pela visita e incentivo.

      Abraço.

Deixe um comentário